Instituto Brasileiro de Museus

Museu do Diamante

“Cultura Material, identidades e memórias negras no MD”

Série produzida no mês da consciência negra

publicado: 24/01/2025 15h33, última modificação: 24/01/2025 16h35

⚒️ TECNOLOGIAS AFRICANAS DE MINERAÇÃO

🏺 O acervo do MD foi formado na década de 1940, a partir de uma ótica museológica que buscou ressaltar a cultura material, os feitos e os valores das elites mineiras. Neste discurso, havia um predomínio das expressões culturais de matriz branca e europeia, em detrimento da diversidade cultural brasileira e das expressões dos povos de matriz africana e indígena. É urgente, portanto, ressignificar os objetos do acervo no sentido de se construir uma narrativa democrática e comprometida com a realidade sociocultural do país.

💎 Hoje, falaremos sobre os utensílios de mineração presentes no acervo e sua ligação com os conhecimentos e tecnologias africanas. Utensílios como bateias, peneiras, sondas e processos de fundição de metais foram introduzidos no Brasil pelas populações africanas, sequestradas de seus territórios em África e para cá trazidas nos tumbeiros, para constituir mão de obra da empresa colonial mineradora.

✨ As populações afro-diaspóricas são detentoras de uma rica tradição tecnológica que se mantém ativa até hoje e que tem sido invisibilizada por interpretações eurocêntricas. Os conhecimentos associados às tecnologias africanas estiveram na origem da mineração e da metalurgia praticadas no Brasil, e se destacavam em sofisticação com relação às técnicas europeias do mesmo período.

👉🏿 No mês da Consciência Negra produzimos a série “Cultura Material, identidades e memórias negras no Museu do Diamante”. Acompanhe abaixo:

📜 Diante de um cenário em que a Igreja Católica proibia manifestações das crenças originárias dos povos escravizados, estes encontraram maneiras de continuar, ainda que de forma velada, praticando suas crenças e venerando sua ancestralidade, numa forma de resistência e também de adaptação à realidade do Brasil escravista.

🍃 No contexto da diáspora, povos de diversas partes da África, detentores de costumes, religiões e línguas diversas, foram trazidos à força nos navios negreiros (tumbeiros) e reunidos em solo brasileiro, precisaram se adaptar e se unir para resistir juntos à escravidão. Um dos meios que estas pessoas encontraram para continuar praticando sua religiosidade e recriando suas identidades através das brechas do sistema escravista, foi por meio da associação de mitologias e divindades africanas às histórias de vida dos santos católicos. Assim, entidades como os Orixás, seres relacionados às forças da natureza e que apresentam marcantes traços de personalidade, foram sendo associados a divindades cristãs, de forma que pudessem continuar sendo cultuados apesar das proibições da Igreja, como é o caso da associação entre Iansã e Santa Bárbara.

🗡️ Iansã é uma orixá guerreira, de temperamento forte e personalidade marcante, sendo considerada a mais valente das Yabás (orixás femininos). Orixá dos ventos e tempestades, tem o poder de encaminhar os mortos (eguns) ao Orum (mundo espiritual). Sua representação é a de uma mulher majestosa e sedutora, e suas cores são o vermelho, o rosa e o marrom. Na mitologia Iorubá, foi esposa de Xangô, o qual a roubou de Ogum. Por sua ligação com Xangô, Iansã é associada aos raios e trovões. Está relacionada à paixão, à intensidade e à impulsividade. Seu dia é 4 de dezembro e sua saudação “Epahey Oyá!”. Seus símbolos são a espada, o chifre de boi e o Eruexim (rabo de cavalo), com o qual controla e afasta o espírito dos mortos. Seu dia da semana é quarta-feira.

✅ Importante frisar que as religiosidades de matriz africana estão presentes no território de Diamantina por meio da organização coletiva em diversos terreiros de Umbanda e Candomblé da cidade, com suas práticas e rituais.

💨 OS CACHIMBOS E OS PROCESSOS DE RECONSTRUÇÃO DE IDENTIDADES AFRODIASPÓRICAS

📜 O acervo do MD foi formado na década de 1940, a partir de uma ótica museológica que buscou ressaltar a cultura material, os feitos e os valores das elites mineiras. Neste discurso, havia um predomínio das expressões culturais de matriz branca e europeia, em detrimento da diversidade cultural brasileira e das expressões dos povos de matriz africana e indígena. É urgente, portanto, ressignificar os objetos do acervo no sentido de se construir uma narrativa democrática e comprometida com a realidade sociocultural do país.

🏛️ Os cachimbos presentes em nosso acervo fazem parte da cultura material dos povos escravizados e das formas de resistência encontradas por estes no contexto da escravidão: os padrões decorativos e estilísticos destes objetos estão ligados às experiências de reconstrução de identidades pelos africanos e seus descendentes no contexto da diáspora, no qual povos das mais diversas etnias e regiões da África foram trazidos à força para o Brasil, por meio do tráfico transatlântico. Nos objetos chama a atenção a decoração com figuras antropomorfas (semelhantes a figuras humanas) e frisos com diferentes padrões geométricos.

❗ Os cachimbos faziam parte do cotidiano dos povos escravizados no Brasil, estando presentes nos cenários rurais e urbanos, ligados ao universo da labuta e às brechas encontradas para obtenção de descanso ou lazer (a famosa “pausa para um cigarrinho”).

🌊 Iemanjá é considerada a rainha das águas salgadas, seu nome deriva da expressão iorubá Yeye Omó Ejá, que significa “mãe cujos filhos são peixes”. É considerada a Grande Mãe dos orixás, e simboliza a maternidade, o amor materno, a fertilidade e a abundância. Representada como uma linda mulher de longos cabelos, Iemanjá é considerada uma orixá vaidosa, que gosta de receber presentes e de ter seus filhos por perto. Suas cores são o azul, o branco e o prateado; seu dia da semana é o sábado e sua saudação é “Odoyá”.

🥘 Diversos pratos da culinária local têm influências da cultura negra, feitos a partir de alimentos que fazem parte do bioma regional e até hoje são produzidos e consumidos nas comunidades rurais e quilombolas da região, como mandioca, cana de açúcar, milho, galinha, porco, hortaliças como taioba, ora-pro-nobis, umbigo de banana e outras. Entre os preparos com alguns destes ingredientes, podemos citar o fubá suado, o bambá de couve, a costelinha com ora-pro-nobis e muitos outros.

🥣 As formas de cultivo dos alimentos na agricultura familiar e a forma de prepará-los são importantes saberes da ancestralidade negra em nossa região. Cada tipo de planta tem uma época certa para o plantio e a colheita, dependendo das chuvas, das temperaturas, dos ciclos da Lua e de vários outros fatores, assim como cada prato envolve várias etapas e “segredos” em seu preparo. Com as ervas e hortaliças cultivadas na região, além de alimentos, se produz também remédios e “garrafadas”, utilizadas pelos raizeiros e benzedeiras para curar vários tipos de doenças. São conhecimentos muito antigos, transmitidos de geração em geração através da oralidade, e que fazem parte do dia-a-dia das comunidades quilombolas do entorno de Diamantina. São conhecimentos que poucas pessoas possuem e que por isso são muito especiais. Estas pessoas detentoras destes saberes são chamadas de Mestres e Mestras da Cultura Popular.

🪮 Nanã é considerada pela mitologia iorubá a mais velha das Yabás (orixás femininos), respeitada como mãe por todos os outros orixás. É uma divindade de origem simultânea à criação do mundo, e representa os mistérios, o nascimento, a vida e a morte. De temperamento brando, acolhe e orienta seus filhos, como uma grande matriarca de muita sabedoria. Representa a velhice, a experiência de vida e os aprendizados mais profundos. Seus domínios são os lagos, os pântanos e a lama; está ligada ao barro que serviu, na mitologia iorubá, para a modelagem e criação dos homens. As cores de Nanã são o branco, o lilás e o roxo, sendo “Salubá, Nanã” a sua saudação.

🎷 Historicamente, a música foi utilizada como estratégia de inserção social por escravizados e forros. Durante os séculos XVIII e XIX a música, sobretudo a música sacra encomendada pelas irmandades para as cerimônias religiosas, missas e procissões, eram executadas principalmente por negros contratados pelas Irmandades religiosas. Aprender e dominar um ofício ligado à música, aprender a tocar um instrumento musical, era uma forma que a população negra (escravizada e liberta) tinha de melhorar suas condições de vida, sendo contratada pelas irmandades para tocar nas missas e procissões, e também obtendo algum reconhecimento social. Lobo de Mesquita, um dos maiores compositores da música sacra brasileira, mundialmente conhecido, era um homem negro.

⛪ A RESISTÊNCIA NEGRA ATRAVÉS DAS IRMANDADES RELIGIOSAS

📜 Nas Minas Gerais do Período Colonial, as Irmandades religiosas tiveram um papel fundamental na construção das igrejas católicas e também na formação de laços de solidariedade e assistência entre os fiéis. As Irmandades do Rosário e das Mercês, que agregavam os setores marginalizados e mais vulneráveis da população (respectivamente, indivíduos de origem africana e escravizados, no caso do Rosário, e negros nascidos no Brasil, “pardos” forros ou libertos, que se concentravam nas Mercês). Estas Irmandades tiveram um papel de destaque na criação e na disseminação de estratégias de negociação e resistência à escravidão, oferecendo assistência e proteção aos escravizados, e atuando nas dinâmicas de compra de alforrias.

📚 Tiveram também um papel marcante na perpetuação e na recriação de identidades no contexto da diáspora africana, possibilitando, através das práticas rituais e cultos afro-brasileiros, a organização coletiva de laços espirituais entre indivíduos de diversos grupos étnicos, religiosos e linguísticos sequestrados de seus respectivos territórios em África e trazidos ao Brasil nos tumbeiros.

🪘 Até hoje ocorrem em Diamantina e seus distritos as Festas do Rosário e a Festa de N. Sra das Mercês, que marcam o calendário local. Sobretudo na Festa do Rosário, tradicionalmente ligada à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, é possível observar os Congados, ou Reinados, que remetem ao antigo Reino do Congo, em África. É uma festa muito rica em rituais que incluem a participação de grupos distintos, denominados guardas (as principais são os Catopês, que representam os negros, além dos Caboclos e Marujos). A Festa simboliza a instalação de um Império negro no Brasil, com coroação de reis e rainhas, danças, cantos e toques de instrumentos musicais que reinterpretam as travessias dos negros da África às Américas.

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